Os Vistos Gold Portugal e a realização do investimento em Criptomoedas
As Criptomoedas são um meio cada vez mais comum de realização de transações online e Portugal é, neste momento, um paraíso fiscal para os investidores e utilizadores destes ativos virtuais. Mas o nosso país também se tornou uma porta de entrada privilegiada para a Europa, através do Programa Golden Visa. Embora se possa equacionar a possibilidade de comprar um imóvel com Criptomoedas em Portugal, será este tipo de investimento elegível para aquisição daquele tão ambicionado “passaporte”?
Em vigor em Portugal desde outubro de 2012, o regime de Autorização de Residência para Atividade de Investimento (ARI) - também conhecido como Vistos Gold ou Golden Visa – é hoje um dos programas de residência por investimento mais bem-sucedidos da Europa.
Através dos Vistos Gold, cidadãos nacionais de Estados Terceiros podem obter uma autorização de residência temporária para atividade de investimento com a dispensa de visto de residência para entrar em Portugal. Para além disso, o beneficiário de ARI tem a possibilidade de, mediante determinados requisitos, residir e trabalhar em Portugal, circular pelo espaço Schengen, sem necessidade de visto, beneficiar de reagrupamento familiar, solicitar a concessão de Autorização de Residência Permanente ou mesmo requerer a aquisição da nacionalidade portuguesa, por naturalização.
Qualquer cidadão nacional de Estados Terceiros pode solicitar um Visto Gold, por si ou através de sociedade constituída em Portugal ou noutro estado membro da União Europeia, desde que cumpra determinados requisitos previstos na legislação aplicável a esta matéria.
De entre as várias possibilidades previstas neste regime, vamos aqui destacar as atividades de Investimento a que os requerentes da ARI mais recorrem: A aquisição de bens imóveis de valor igual ou superior a 500 mil euros e a aquisição de bens imóveis, cuja construção tenha sido concluída há, pelo menos, 30 anos ou localizados em área de reabilitação urbana e realização de obras de reabilitação dos bens imóveis adquiridos, no montante global igual ou superior a 350 mil euros.
Ora, sendo possível equacionar-se a hipótese de pagar em Criptomoedas a compra de um imóvel ou o sinal, no âmbito de um contrato promessa, resta saber se este negócio terá enquadramento legal no Regime de Autorização de Residência para Atividade de Investimento (ARI).
A adoção de criptomoedas como opção de pagamento tem sido um processo cada vez mais utilizado por profissionais e empresas de diversos setores. Veja-se, entre outros, os casos da Axa Seguros, Tesla, MasterCard, Microsoft, PayPal, Starbucks, SLBenfica, ou mesmo a UNICEF, que se tornou a maior instituição de caridade a aceitar doações em Criptomoedas. Do outro lado do Mundo, a Nova Zelândia tornou-se no primeiro país a legalizar pagamentos de salários em criptomoeda.
Também são conhecidos alguns negócios imobiliários e outras operações realizadas com recurso a pagamentos em Criptomoedas, sendo a Bitcoin a mais utilizada.
O Banco de Portugal considera que as Criptomoedas como “ativos virtuais que não têm curso legal em Portugal”. Mas, para este organismo supervisor, não há ilegalidade nem proibição de utilização de Criptomoedas. Aliás, só há uma matéria em que o supervisor dos bancos tem competências relativamente à Bitcoin e restantes criptomoedas: prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo. Neste campo, e como admite o Banco de Portugal, há o risco de as transações serem utilizadas indevidamente para atividades criminosas. Mas esse risco, refira-se, também existe no próprio sistema bancário tradicional.
Noutro prisma, a Autoridade Tributária veio também clarificar alguns aspetos ao considerar que os rendimentos obtidos através de criptomoedas não se inserem em nenhuma categoria tributável de rendimentos. Considera apenas a possibilidade de tributar esses rendimentos quando os mesmos possam ser considerados como rendimentos profissionais, ou seja, exige-se a prova que os rendimentos têm uma recorrência regular e que constituem actividade profissional do cripto-investidor. Assim, na prática, o entendimento da Autoridade Tributária quanto às criptomoedas é a de que os rendimentos gerados não são tributados, a não ser que sejam fruto de profissão dos seus titulares.
Não é novidade que o mercado das criptomoedas está em expansão. Como já se referiu, as moedas digitais são um meio cada vez mais comum de gerar riqueza e fazer transacções online e Investidores de todo o mundo escolhem Portugal como destino para a sua atividade sedimentada em criptomoedas por ser dos poucos países do mundo que não tributa – ainda - os rendimentos provenientes do investimento em criptomoedas, de uma forma geral. Se, a isso, juntarmos a possibilidade de se obter Autorização de Residência para Atividade de Investimento (ARI), então o cenário seria muito mais favorável.
Regressando aos Vistos Gold:
Para o tipo de investimento a que se fez referência - aquisição de bens imóveis - o interessado em obter o Golden Visda terá que demonstrar que efetuou o investimento no valor mínimo exigido, instruindo o processo com um conjunto de documentos que o comprovem. Entre outros, e para além do título aquisitivo do ou dos bens imóveis ou contrato-promessa de compra e venda dos mesmos, o investidor deverá apresentar uma “declaração de uma instituição de crédito autorizada ou registada em Território Nacional junto do Banco de Portugal atestando a transferência internacional (e efetiva) de capitais” para a sua aquisição ou para o pagamento do sinal, tratando-se de contrato promessa de compra e venda. Ou seja, em condições normais, uma declaração de uma Entidade bancária registada no Banco de Portugal que ateste ter recebido, na conta bancária que o investidor estrangeiro constituiu em Portugal, o capital necessário para o negócio através de uma transferência internacional, proveniente de uma outra Instituição.
Atendendo a este requisito, mesmo prevendo a possibilidade de se poder adquirir um imóvel em Portugal pagando o respetivo preço em Criptomoedas, até que ponto é que este negócio poderá ser elegível para que o investidor solicite, com sucesso, um Visto de Residência pelo Investimento? Mais do que uma resposta concreta a esta questão, importa tecer algumas considerações para contextualizar e perceber toda esta temática.
Por definição, uma criptomoeda é um “meio de troca, podendo ser centralizado ou descentralizado que se utiliza da tecnologia de blockchain e da criptografia para assegurar a validade das transações e a criação de novas unidades da moeda”. Ou seja, as Criptomoedas são moedas virtuais cujo funcionamento assenta na criptografia. Não são físicas nem são mais do que um instrumento financeiro que existe apenas na internet. Ao contrário das moedas emitidas por cada país, as criptomoedas não são geridas por bancos centrais.
As criptomoedas são moedas digitais que usam a tecnologia blockchain que permite a negociação direta entre as partes, sem depender, por exemplo, de uma instituição financeira ou qualquer outra entidade para fazer a intermediação, supervisão ou autorização da transação. Essas transações são validadas por todos os usuários e registadas e, para garantir a sua segurança, são criptografadas. É como se cada participante ficasse com um recibo dessa transação armazenado no sistema eletrónico.
Assim, qualquer pessoa pode comprar uma ou várias criptomoedas (ou frações de Criptomoedas) através de uma corretora e criar uma carteira digital para as guardar e realizar as suas transações ou pagamentos para qualquer parte do mundo. Nalguns casos, as corretoras disponibilizam cartões de pagamentos (em tudo semelhantes a um multibanco) que permitem levantar dinheiro, em euros no caso de Portugal, em qualquer caixa multibanco ou realizar pagamentos, por exemplo, em hipermercado, em postos de abastecimento de combustível, em cafés ou restaurantes, em lojas ou livrarias, viagens, hotéis, como se de um normal cartão de débito se tratasse.
Assim, com aquela sua carteira digital o titular pode realizar várias transações para outras carteiras digitais ou receber pagamentos de outras carteiras digitais. Ou pode, ainda, efetuar transferências entre a sua conta bancária e a sua carteira digital. No fundo, a corretora onde o investidor tem a sua carteira digital é muito semelhante à plataforma digital ou app de uma instituição bancária, onde o titular pode consultar os seus saldos, movimentos, efetuar transferências ou outras operações. Mas, enquanto que numa conta bancária normal, as operações são em moeda fiduciária (no caso de Portugal, em euros) naquela, é tudo feito em Criptomoedas, muito embora possa existir a possibilidade de converter noutra moeda, digital ou não.
Posto isto, voltamos à questão relacionada com a transferência internacional (e efetiva) de capitais para que o investidor possa cumprir com o requisito imposto pelo atual Regime de Autorização de Residência para Atividade de Investimento.
E, aqui chegados, somos de imediato conduzidos a esta questão: e se o investidor realizar uma transferência da sua carteira digital para a conta bancária de que é titular em Portugal? Esta operação, a ser possível, poderá ser considerada uma transferência internacional para aqueles efeitos?
A resposta a esta – e muitas outras questões que se colocam e colocarão – não será certamente tão óbvia como se poderia antever e desejar. Na verdade, a admitir-se aquela hipótese, estaríamos de facto perante uma transferência internacional de capital entre instituições como prevê aquele normativo?
Dúvidas não existem de que, a ser possível (e parece ser…), se trataria de uma transferência efetiva de capital. Neste caso de Criptomoedas para euros, da carteira digital para a conta bancária. Todavia, é pública a posição do Banco de Portugal que considera que “os ativos virtuais não têm curso legal em Portugal, pelo que a sua aceitação pelo valor nominal não é obrigatória”
Assim, em conclusão, no atual contexto, parece pouco provável que alguma instituição de crédito autorizada ou registada em Território Nacional junto do Banco de Portugal viesse a emitir uma declaração atestando a transferência internacional (e efetiva) de capitais, tratando-se, neste caso, da transferência de Criptomoedas para a compra de um bem imóvel.
Isto não obstante a possibilidade de, em qualquer outra circunstância, realização do negócio de compra e venda do imóvel ou prestação de um sinal, no caso de contrato promessa, ou qualquer outro investimento mediante o pagamento do preço em Bitcoin ou noutra criptomoeda.
Ainda no âmbito dos Vistios Gold pode mesmo admitir-se a possibilidade de todas as taxas, encargos e demais despesas ocasionadas com o processo poderem ser pagas em Criptomoedas.
Em conclusão
O mundo das transações financeiras tem vindo a evoluir a uma velocidade vertiginosa desde os tradicionais pagamentos em numerário. Agora, a mais badalada forma de pagamento a surgir numa economia cada vez mais digital e global é a criptomoeda. E há quem assegure que a Bitcoin e companhia são as moedas do futuro. Por isso, a sociedade e a justiça deverão inevitavelmente ter de se adaptar a esta evolução. Este futuro das Criptomoedas e dos negócios com ela processados dependerá muito da posição e regulação que cada pais adotar em relação a esta realidade.
Mas, como em todas as tecnologias emergentes, vamos ver até que ponto as empresas, Instituições financeiras, como bancos ou empresas de cartões de pagamento que já aderiram às Criptomoedas e demais investidores se irão juntar a esta revolução. Mas ainda há muito por fazer quanto à regulação e utilização das Criptomoedas. Trata-se de um desafio que deverá ainda dar muito que falar nos próximos anos e nós cá estaremos para acompanhar.
Mas quando poderemos afirmar, com a segurança e certeza jurídicas necessárias, que um investimento com recurso a Criptomoedas será elegível para aquisição de um Golden Visa em Portugal?
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