Regime da Zona Franca da Madeira prorrogado até 2033 para investidores e empresas
A Assembleia da República aprovou a extensão das regras fiscais aplicáveis ao Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM) / Zona Franca da Madeira, permitindo que as empresas licenciadas continuem a beneficiar da taxa especial de IRC de 5% até 31 de dezembro de 2033.
Ao mesmo tempo, foi confirmado que as entidades que obtenham autorização para operar no CINM até 31 de dezembro de 2026 mantêm acesso ao regime até 2033, nas mesmas condições. O prazo para registo de novas entidades não foi, portanto, alterado neste momento.
Esta decisão repõe um quadro de previsibilidade que vinha sendo reivindicado por operadores e investidores, num contexto em que o CINM representa hoje mais de 2.400 empresas, cerca de 82% das exportações da Região Autónoma da Madeira e receitas fiscais anuais próximas dos 100 milhões de euros.
1. Enquadramento: o que é, afinal, o CINM?
O CINM (Regime IV) é um regime fiscal regional, aprovado em articulação com a União Europeia como auxílio de Estado compatível, destinado a promover o desenvolvimento económico da Madeira através da atração de investimento e da internacionalização de empresas ali sediadas.
Características essenciais (em síntese):
- Tributação em IRC à taxa de 5% sobre os lucros derivados de atividades qualificadas realizadas a partir da Madeira;
- Benefícios em matéria de retenção na fonte sobre dividendos pagos a sócios/acionistas (nas condições previstas na lei – nomeadamente residência em jurisdições elegíveis e ausência de regimes privilegiados);
- Regime sujeito a limites máximos por empresa, dependentes do número de postos de trabalho criados/manutenção de emprego ou do volume de investimento realizado;
- Enquadramento específico para shipping e registo internacional de navios, igualmente beneficiando de tributação reduzida.
Desde a sua criação, o regime tem sido objeto de sucessivas renegociações com a Comissão Europeia para garantir a sua compatibilidade com as regras de auxílios de Estado, bem como de decisões e investigações relacionadas com a correta aplicação dos requisitos de “substância” e de criação de emprego
2. O que foi agora aprovado: a extensão até 2033
A extensão resulta da aprovação, na especialidade, de uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2026, apresentada por deputados madeirenses, que prolonga por cinco anos a vigência da taxa reduzida de 5% em sede de IRC.
Em termos práticos:
Empresas já licenciadas no CINM
- Mantêm a aplicação da taxa de 5% sobre os lucros elegíveis até 31 de dezembro de 2033, desde que continuem a cumprir todas as condições do regime.
Novas empresas / novos projetos
- Poderão beneficiar da taxa de 5% se obtiverem autorização/licença até 31 de dezembro de 2026;
- Uma vez licenciadas até essa data, gozam igualmente do regime até 2033.
Prazo para novas licenças
- À data em que escrevemos, a informação disponível aponta para a não alteração do prazo de registo de novas entidades, que permanece em 31.12.2026 – apesar de terem existido propostas políticas para o estender a 2027, que não foram aprovadas
Situação legislativa
- A decisão parlamentar aguarda ainda promulgação e publicação em Diário da República. Até lá, recomenda-se prudência: os investidores devem basear decisões em parecer jurídico atualizado e acompanhar o texto final da lei.
3. Principais benefícios fiscais mantidos
Sem prejuízo do texto definitivo da lei, tudo indica que a lógica de base do regime permanece a mesma. Em termos muito resumidos:
- IRC à taxa de 5%
- Aplicável aos lucros derivados de atividades qualificadas realizadas no âmbito do CINM (serviços, trading, holdings, shipping, e-business, indústria/armazenagem, entre outras atividades previstas na legislação aplicável);
- A taxa reduzida não é, em regra, aplicável a rendimentos estranhos à atividade desenvolvida a partir da Madeira (por exemplo, certos rendimentos passivos, salvo enquadramentos específicos).
- Benefícios em sede de IRS/IRC sobre dividendos
O regime do CINM tem, historicamente, previsto isenções ou reduções de retenção na fonte sobre dividendos distribuídos a sócios/acionistas que cumpram determinados critérios (residência em país elegível, ausência de regime fiscal privilegiado, etc.), bem como certas operações de amortização de quotas.
Espera-se que a extensão a 2033 mantenha esta arquitetura, embora possam existir ajustamentos pontuais a confirmar com base no texto final.
- Outras vantagens
- Possível redução de derramas regionais/municipais (consoante o enquadramento concreto e a legislação em vigor a cada momento);
- Enquadramento favorável para registo de navios e iates, com regime específico de shipping;
- Ambiente regulatório relativamente estável, com infraestrutura local e serviços especializados (contabilidade, banca, consultoria) vocacionados para o regime.
4. Condições de acesso e manutenção: não basta “ter sede na Madeira”
Um ponto essencial que muitas vezes é esquecido: o CINM não é um “offshore clássico”, mas sim um regime de auxílio de Estado regional cuja legitimidade assenta precisamente na existência de atividade económica real na região.
Entre as principais exigências contam-se:
- Substância económica real
- Criação e manutenção de um número mínimo de postos de trabalho na Madeira; ou
- Alternativamente (em certos casos), realização de investimento mínimo qualificado em ativos fixos.
- Limites máximos de benefício
- A vantagem fiscal é limitada por tetos ligados ao número de trabalhadores e/ou investimento – não é um benefício ilimitado.
- Requisitos de governação e compliance
- Administração efetiva e direção de topo situadas na Madeira;
- Cumprimento rigoroso de obrigações contabilísticas, de reporte e de prevenção do branqueamento de capitais (KYC/AML);
- Ausência de utilização abusiva do regime para canalizar rendimentos não ligados à atividade local.
- Compatibilização com normas internacionais
- Regras anti-abuso (GAAR), ATAD, DAC6, bem como, para grandes grupos, a eventual aplicação de Pillar Two (GloBE) e taxa mínima de 15% em jurisdições da casa-mãe, podem neutralizar parcialmente o benefício em determinados casos.
5. Impacto prático para investidores e grupos empresariais
A extensão até 2033 tem vários efeitos práticos relevantes:
Estabilidade e previsibilidade
- Permite a grupos internacionais e investidores individuais planear estruturas societárias e de financiamento com horizonte temporal mais longo, reduzindo o risco de alteração abrupta do regime.
“Janela de oportunidade” até 2026
- Quem pretenda constituir ou relocalizar estruturas para o CINM dispõe, em princípio, de até 31.12.2026 para obter a licença, beneficiando depois até 2033;
- Projetos complexos (holding internacional, plataformas de serviços partilhados, centros de trading, registo de navios, etc.) devem ser analisados e implementados com tempo, evitando decisões de última hora.
Revisão de estruturas existentes
- Grupos que já possuem entidades no CINM devem aproveitar esta extensão para rever se continuam a cumprir todas as condições, incluindo substância, documentação de transfer pricing, e adequação às normas internacionais recentemente reforçadas.
Madeira como alternativa dentro da UE
- Num contexto em que diversos Estados-membros têm vindo a restringir regimes preferenciais, o CINM mantém-se como praça relevante para planeamento fiscal internacional dentro da União Europeia, com a vantagem adicional de estar sujeito a escrutínio comunitário – o que reforça a sua credibilidade quando corretamente utilizado.
6. Riscos e pontos de atenção
Apesar das oportunidades, há riscos e limitações que não podem ser ignorados:
- Dependência de aprovação / controlo europeu
- Qualquer extensão do regime permanece subordinada às regras de auxílios de Estado; a Comissão Europeia tem já um histórico de investigações e decisões sobre o CINM, designadamente quanto à correta aplicação dos critérios de criação de emprego e elegibilidade de lucros.
- Risco reputacional
- Estruturas mal desenhadas ou sem substância real podem expor empresas e beneficiários a riscos reputacionais, fiscais e até penais (planeamento abusivo, branqueamento, etc.)
- Mudanças futuras no quadro internacional
- A implementação plena de normas de taxa mínima global e outros instrumentos anti-erosão fiscal poderá, em certos grupos multinacionais, neutralizar o benefício efetivo da taxa de 5%, exigindo uma análise caso a caso.
- Eventual litigância
- Experiências anteriores demonstram que decisões da Comissão e dos tribunais europeus podem ter impactos retroativos em determinados tipos de estruturas; é crucial garantir que a utilização do regime é sempre feita de forma conservadora e bem documentada.
7. Próximos passos para quem pondera o CINM
Para investidores, empresários ou grupos multinacionais que considerem a utilização do CINM, alguns passos práticos recomendáveis:
Análise preliminar de viabilidade
- Avaliar se o modelo de negócio se enquadra nas atividades elegíveis;
- Estimar impacto fiscal efetivo (incluindo normas internacionais e legislação do país de residência dos sócios).
Desenho da estrutura societária e contratual
- Definir a “arquitetura” do grupo (holding, trading, IP, serviços partilhados, shipping, etc.);
- Estabelecer políticas de preços de transferência, financiamento intra-grupo, contratos de serviços e licenças.
Planeamento de substância local
- Dimensionar a equipa na Madeira, instalações, funções de gestão e decisão;
- Garantir que os requisitos de emprego e/ou investimento são realistas e sustentáveis.
Governance e compliance contínuos
- Implementar procedimentos robustos de compliance fiscal, societário e AML/KYC;
- Rever periodicamente a estrutura face à evolução da legislação nacional e europeia.
8. Conclusão
A prorrogação do regime do CINM até 31 de dezembro de 2033, mantendo a taxa de IRC de 5% para entidades licenciadas até 31 de dezembro de 2026, representa um sinal claro de continuidade e reforço da segurança jurídica para investidores que apostem na Madeira como plataforma de internacionalização.
Contudo, a utilização deste regime deve ser estrategicamente pensada e juridicamente bem estruturada, de forma a:
- garantir o cumprimento integral das exigências de substância e das regras europeias de auxílios de Estado;
- evitar modelos agressivos que possam ser requalificados como abuso;
- maximizar, de forma sustentável, as vantagens fiscais e económicas que o CINM oferece.
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